24 outubro, 2009

A transformação acontece por dentro







Releio “ A Profecia Celestina” um livro de James Redfield que já lera, há uma década atrás, com um prisma contextualizado nessa fase da minha vida. Encontro-me de novo com o texto deste livro encarando-o, agora, de uma forma renovada pelo meu olhar actual, através das lentes que o meu percurso de vida me tem facultado.

Uma das questões que me acompanha desde que iniciei o processo de iniciação à consciência (de mim e do que me rodeia) é o de saber o porquê de os seres humanos necessitarem, muitas vezes de forma ávida, de preponderância nas relações que estabelecem entre si. E quando falo de “preponderância” refiro-me àquilo que no processo social seriam as fases extremas – a Competição descontrolada e o Conflito que leva à eliminação do Outro.






Inside the water tank of the ancient Portuguese fortress town Mazagan, Morocco.
Raincatcher
© Mandy Schoch

A teoria deste processo estudado nas Ciências Sociais, diz-nos haver três estados de relação em sociedade a Cooperação, a Competição e o Conflito. O que levará determinadas sociedades, grupos e indivíduos a seguir tendencialmente os dois últimos estados deste crescendo? (Cheguei mesmo a questionar ao Prof. Jorge Vala sobre esta questão, num curso sobre Etnicidade, migrações e Racismo no ICS da Universidade de Lisboa).

Como sabemos a forma como a sociedade está organizada poderá responder a essa questão. A Estrutura determina, muitas vezes sem termos consciência , o modo como os indivíduos pensam. As relações de troca, a economia, condiciona as relações sociais e a própria Estrutura. Mas a Educação também nos dá um mundo já concebido. Cabe-nos a nós, a par e passo, conhecer o que nos rodeia e o mundo que nos é dado a perceber, associando instrumentos de olhar e ver o mundo que só nós próprios com a grelha que construímos podemos utilizar, articulando a teoria e a prática.

Bom, recuando à questão que sempre me preocupou e que de certa modo me levou a estudar as Relações Internacionais e depois as Interculturais chegando mesmo às relações interpessoais - a da preponderância que leva muitas vezes ao aniquilamento psicológico do Outro. De acordo com as Ciências Sociais, parece que houve sempre esta tendência nas sociedades, que pode, ou não ser exarcebada de acordo com políticas e estratégias de controlo – a nível macro - e nos indivíduos de acordo com a sua própria educação e índole – a nível micro.

O livro A Profecia Celestina de James Redfield, cabe neste texto porque sugere o desvendar de um manuscrito, encontrado no Perú, que pode ser entendido como a descoberta que cada um poderá fazer da vida que tem e da forma como pode alterar e transformar a relação com os outros. Deixo aqui algumas passagens que me tocaram e que revelam um prisma sobre as relações entre indivíduos:

“ O meu campo de estudo é o conflito, ver por que razão os seres humanos se tratam uns aos outros com tanta violência. Sempre soubemos que essa violência tem origem no impulso que existe nos homens e que os leva a quererem controlar e dominar os outros, mas só há pouco começámos a estudar esse fenómeno do ponto de vista da consciência individual, ou seja a partir de dentro. Pusémos a pergunta: o que se passa no íntimo de um ser humano que o leva a querer controlar outro? E descobrimos que, quando um indivíduo se dirige a outro e entabula com ele uma conversa …, uma de duas coisas pode resultar desse encontro: o indivíduo sai desse encontro forte ou fraco, consoante o que aconteceu em termos de interacção. (…) (Redfield, p. 93)

É por isso (…) que nós, os seres humanos parecemos estar sempre a assumir uma atitude manipuladora. Independentemente dos pormenores concretos de cada situação ou do assunto em causa, preparamo-nos sempre para dizer o que for preciso, para fazer prevalecer o nosso ponto de vista. Cada um de nós procura uma maneira de controlar e de dominar a conversa. Se o conseguirmos, se o nosso ponto de vista prevalecer, nesse caso, em vez de nos sentirmos fracos, receberemos um reforço psicológico.” (Redfield, p. 93)

Mais à frente, Redfield dá-nos uma situação concreta:
“ - Meu Deus! - disse eu. - O tipo deve ser mesmo diabólico.
Não propriamente – contrapôs ele. - Provavelmente, só tem uma noção muito relativa do que faz. Acha-se com o direito de controlar as situações e não há dúvida de que há muito que aprendeu a fazê-lo, seguindo uma determinada estratégia. Começa por se fazer muito seu amigo; em seguida, descobre algo de errado que você tenha feito, no seu caso, por exemplo, que você corria perigo. Na realidade, consegue muito subtilmente sabotar a confiança que você tem no caminho que está a seguir, até você acabar por se identificar com ele. Mal isso acontece, está nas mãos dele....
Esta é apenas uma das estratégias que as pessoas utilizam para tirar energia umas às outras....
A maior parte das pessoas ainda não tem consciência desta realidade. Só sabemos que nos sentimos fracos e que nos sentimos melhor quando controlamos os outros. O que não percebemos é o que o facto de nos sentirmos melhor custa aos outros, cuja energia roubamos. A maior parte das pessoas passa a vida a procurar obter constantemente a energia das outras...” (Redfield, p. 113)

Por outras palavras, nós, os seres humanos, procuramos exceder os outros em astúcia e controlá-los, não porque esteja em jogo uma meta tangível existente no mundo exterior, algo de concreto que queiramos atingir, mas porque precisamos do bem-estar psicológico que daí resulta. É por esta razão que existem tantos conflitos irracionais no mundo, quer a nível individual, quer ao nível das nações.”
(A Profecia Celestina, James Redfield, p. 93)

Parece-me interessante a perspectiva de Redfield quanto ao poder assente na energia dos indivíduos e à forma como essa energia pode ser utilizada. Estou de acordo com alguns autores que li no âmbito das Ciências Sociais, quando referem que apenas a Educação, a aprendizagem e consciência humanas (do Eu, do Outro e do Mundo) podem atenuar e mesmo contrariar este processo tendencial, que acontece nas relações sociais enquanto relações de "poder" extremado, alterando a mentalidade humana....e aí talvez possamos entender melhor esta passagem do mesmo livro....

“Compreendi que tudo fazia, de certo modo, parte de mim. Estar sentado no cume da montanha a olhar as paisagens que dali partiam em todas as direcções fez-me sentir que o que sempre tomara como o meu corpo físico não era senão a cabeça de um corpo muito mais vasto, feito de tudo o resto que o meu olhar conseguia abarcar. Experimentei o universo inteiro a observar-se através dos meus olhos.” (Redfield, p. 125)

Gisela Ramos Rosa, Outubro de 2009



Excertos retirado de:
A Profecia Celestina
, James Redfield, pp. 93, 113, 125

* James Redfield é licenciado em sociologia e mestre em Assistência Social. Trabalhou muitos anos com adolescentes vítimas de maus tratos, é mundialmente conhecido pelos seus escritos sobre a vida espiritual e as relações entre a experiência e a dimensão sagrada do universo.

14 comentários:

Álvaro disse...

Un placer entrar en tu blog y ver la selección de fotos que nos muestras. Espectaculares.
Saludos

Gisela Rosa disse...

Gracias Alvaro é um prazer receber tuas palavras! Saludos

Voar sem Hasas disse...

Quero acreditar que oa razão dos conflitos é a falta de se conhecerem,o desconhecimento leva ao conflito.

O dialogo, o entendimento é das melhores formas de se mediar um conflito,até de evitá-lo.... quando as partes se entendem, percebem que o que os une é mais que os que os separa........


um beijo

O texto está muito bom,a foto como é habitual,deslumbrante

Gisela Rosa disse...

Voar sem Hasas, obrigada pelas palavras. Concordo consigo quanto ao que diz. O diálogo e a aproximação exigem disponibilidade para o Outro.

Obrigada, um abraço

Gisela Rosa disse...

Coloco aqui um endereço de um visitante, Luís Costa, que se interessou por este tema e escreveu sobre ele, para quem quiser consultar poderá fazê-lo aqui:

http://oarcoealira.blogspot.com/2009/10/uma-reflexao-sobre-educacao-ou.html

Sishir disse...

Wow, amazing blog. Dropped by chance & definitely coming back again.

Anónimo disse...

Este texto faz-me lembrar a Lei de Mendel ... a lei da sobrevivência analógicamente! Bom trabalho aqui publicado... Parabéns Gi!
Beijinho

eddy disse...

Sem dúvida, uma questão que se torna central em todas as sociedades humanas.
Parabéns pela partilha..


Um "saludo"

eddy disse...

ahh..peço desculpa pela falha, esqueci-me de referir o seguinte: como se faz essa antropologia dos sentidos e dos sentimentos dos "outros"...

Lucas Mendes disse...

que imagem incrível, só posso te dar parabens pelo post. a fotografia em deixou sem mais palavras .

Manuela Freitas disse...

Conflitos sempre existirão, porque sempre teremos pela frente muito desconhecimento, sobre nós e os outros!...
O Blogue é muito bom, relativamente a texto e imagem, parabéns!...
Fiquei rendida.
Bjs,
Manuela

Carmo disse...

Foto e texto irrepreensíveis, como sempre.

Beijinho

Carmo

Bom fim-de-semana

Unknown disse...

Fantástica esta imagem, de paragens portuguesas pelo Mundo.
Parabéns pelo blog.

myra disse...

outras palavras super verdadeiras... beijao